quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Um OUTRO ensaio


(Labirinto em construção à maneira de Durrenmatt)
Direcção: Lígia Roque
Interpretação: Daniel Pinto, Daniela Vieitas, Joana carvalho, João Castro e Sara Carinhas.

(Quarta, dia 29 de Dezembro de 2010)

  
  Miragaia, porta 61, uma entrada mais entre os arcos de pedra gasta.
  Lá dentro, um espaço despojado, todo negritude, escassas fiadas de bancos defronte do "palco", aguardando o que se seguiria. E nós, público que sobre eles se distribuiu, irmanados nessa espera.
  Tal ausência de "coisas", o cenário reduzido a parcos objectos, a escuridão palpável , propiciou o enquadramento perfeito para que o texto de Friedrich Dürrenmatt se fosse impondo, espelhando as suas subtilezas, oferecendo uma outra história dentro da história, oscilante entre a tragédia predestinada e uns apontamentos de humor sabiamente introduzidos. 
   A chegada dos momentos de luz, rompendo o negro, a crueza com que desvelavam e, simultaneamente, despojavam as faces das personagens e impulsionavam a dinâmica da peça, revelou-se uma solução engenhosa. E através das vozes e gestos dos que cruzaram e dominaram o palco, tornou-se possível recriar de forma clara todos os espaços que não vimos: o interior das grades e o desespero, que ainda assim se mostrou risível; a rua, caminho fora até ao edifício barroco; a escadaria penosamente subida, em direcção à mulher subitamente desejada e ao crime prometido...E assistir ao crescente imiscuir dos mundos, à "transfiguração" final, culminar de um trajecto que começou no desdém de quem, do lado de cá, se sentia tão seguro e afirmava cioso dos pormenores em falta da história lacunar, e terminou dentro dela, clamando pela inocência de um homem que, por imposição, acabou por, enfim, ganhar nome. Clamando contra O Outro (assim prefiro que continue a chamar-se), o criminoso manipulador. O epílogo a chegar quase que sob a forma de "vitória" de quem tudo teceu e urdiu.
  Tudo, naquele Outro Ensaio, funcionou. Seria um prazer re-ver e re-ouvir as vozes deste eventual "sonho", tal como foi oferecido a quem penetrou naquela porta. Mais tivessem podido fazê-lo... 

 Andreia Magalhães

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Belonging - Teatro do Montemuro e Foursight Theater

Texto: Peter Cann
Encenação: Naomi Cooke e Steve Jonhstone
Neste último Sábado assisti, em Viseu, à nova produção do teatro do Montemuro. O espectáculo chama-se Belonging  e resultado de uma co-produção entre esta companhia e uma companhia inglesa. Pela ficha técnica percebe-se que os créditos para criar o espectáculo foram divididos entre as duas estruturas.
Acompanho o trabalho do Teatro do Montemuro já há alguns anos e sempre fui habituado ao rigor e empenho. Mesmo que alguns espectáculos não tenham sido tanto do meu agrado e de sentir que o trabalho para a infância não é tão bem conseguido (excepção ao Karibó e ao Mãos Grandes), a verdade é que, no geral, é das companhias que mais tenho gosto em acompanhar , que mais me dá alegrias enquanto público e mais momentos inesquecíveis me proporcionou.
Esta foi a vez em que assisti a um espectáculo numa zona mais próxima do local onde estão sediados, normalmente é por terras da capital que os vejo. Mas desta vez, coincidindo com umas pequenas férias, tive oportunidade de os ver em Viseu. O meu espanto é ver que, por esses lados, há menos público para o teatro do Montemuro do que em Lisboa… mas enfim, parece que é mania dos portugueses em dar pouca importância ao que está perto e só gostar do que é de longe… adiante!
O espectáculo está muito bem conseguido ao nível do texto pois, sendo todo interpretado em inglês e português a informação é completa em cada uma das línguas, alguém que só saiba uma delas percebe integralmente o espectáculo e os diálogos são inteligentemente articulados de modo a que a tradução nunca seja directa. O que mais surpreende é que, apesar de aos nossos ouvidos soarem duas línguas, dá a sensação que no palco a linguagem é só uma, tão bem a comunicação verbal entre os actores é feita.
O tema (trafico de crianças) está muito bem abordado, não se percebe logo de inicio que é sobre isso que se vai falar. As personagens vão dando a descobrir os mistérios que se escondem por de trás do negócio de um talhante e por de trás de cada personagem.
As interpretações são um pouco desequilibradas, não por uns serem melhores que outros, mas mais porque os estilos utilizados são diferentes (actrizes inglesas mais “estilizadas”, actores portugueses mais com emoções e coração) e daí resulta uma mistura que, de certa forma, não toca no público.
Cenário e figurinos cumprem e estão ao serviço do espectáculo.
Um grande trunfo do espectáculo é a música ao vivo e a estrutura dramatúrgica baseada em canções que provocam distância e, ao mesmo tempo, aumentam a carga dramática do espectáculo. Um Musical Negro, seria uma forma de qualificar este espectáculo.
Para saber onde o espectáculo vai estar (e aconselho vivamente a que assistam) consultem a agenda em http://www.teatromontemuro.com/
Carlos A. Mendes

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Dueto para um

Ensemble Teatro
Encenação: Carlos Pimenta
Texto: Tom Kempinski
Interpretação: Emília Silvestre e Jorge Pinto

Está em cena, no Carlos Alberto, este "Dueto para um", numa carreira que, é pena, parece que vai ficar por ali. Mas o Ensemble nunca teve vocação de companhia peregrina e raríssimas vezes se deu ao trabalho de tentar sair do perímetro da invicta.
O espectáculo serve bem um texto belíssimo que toca no mais profundo do que é a humanidade, do que nos faz ser Pessoas, com consciência de nós próprios. Em traços gerais assistimos às várias consultas que uma violinista solista e de sucesso tem com um psiquiatra a partir do momento que sabe que sofre de esclerose múltipla e que deixa de poder tocar violino. Assistimos à luta desta mulher em negar os seus sentimentos mais profundos e a entrar num percurso de auto destruição que é aplacado pelo esforço do médico que a acompanha. O fim é aberto. Será que ela encontra a redenção? Será que encontra a paz? De que forma?
As interpretações são brilhantes, a encenação é média, limitando-se a dar voz ao excelente trabalho dos actores. Perde-se demasiado tempo entre entradas e saídas que percorrem sempre o mesmo ritual, só para que depois os actores apareçam com figurinos diferentes. Tanta mudança de roupa faz perder a força da mudança final da violinista, que termina o espectáculo com um vestido de noite que dá imensa energia às palavras do Adeus.
Do cenário: a inutilidade de uma imagem projectada no fundo (que torna a coisa até um bocado pirosa), completamente desnecessária, não acrescenta em nada ao espectáculo. Era uma tentativa da passagem do tempo? Tempo interior? Tempo real? A mim pareceu-me mais uma utilização só porque sim…
O trabalho, no geral, é muito bem executado pela dupla de actores. O texto, trabalhado por uma equipa menos atenta, poderia ter resvalado para algo mais peganhoso, melodramático, mas os actores aguentam bem o registo, com um Jorge Pinto a fazer um contraponto fabuloso para a dor daquela mulher. A Emília Silvestre faz um trabalho perfeitamente equilibrado, mantendo toda as emoções na dose certa, sem nada dar de forma gratuita.
Vale a pena ver! Toca no mais fundo de nós.
 Ana Elisa

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Um Violino no telhado

DIRECÇÃO ARTÍSTICA
ENCENAÇÃO, CENOGRAFIA e FIGURINOS
Filipe La Féria
DIRECÇÃO VOCAL E ASSISTENTE DE ENCENAÇÃO
António Leal
COREOGRAFIA
Inna Lisniak
Com: José Raposo, Rita Ribeiro, Joel Branco, Carlos Quintas, Helena Rocha, Hugo Rendas, Sissi Martins, Ruben Madureira, Rogério Costa, entre outros.
Começo por dizer, sem medo nenhum: Um violino no telhado é um belíssimo espectáculo. Filipe La Féria excede-se, mais uma vez e prova que teatro musical como ele mais ninguém faz neste país. Com o arrojo, o profissionalismo visível, com o poder de encantar e emocionar o espectador. Raras vezes me emociono quando vou ao teatro e muitas dessas raras vezes são nos espectáculos deste senhor. A forma escorreita como ele nos consegue transportar para um mundo de sonho, tudo na encenação, na luz, nos figurinos, tudo está impecavelmente bem conseguido e nada se suplanta a nada, tendo tudo como propósito ser o veículo desta história de encantar, comme il faut. Este é um espectáculo que não pede desculpa por existir e que poderia estar tanto no Politeama como noutro lugar qualquer. O espectáculo é bom. Levem os pais, os tios, os sobrinhos. Tenho a certeza que todos vão gostar.
Parte já de uma premissa segura: este musical é um dos mais populares de sempre, o que à partida pode querer dizer muita coisa, ou seja, pode ser mal feito e pode ser bem feito. Neste caso, impecavelmente bem feito. Dá gozo ir ao teatro e ver tanto e tão bom profissionalismo e talento em cima do palco. Ou não estivesse à frente deste grande elenco José Raposo, um actor que é sempre superlativo, sempre excelente. Não há maneira de lhe pôr defeito. E é generoso e está rodeado de actores também eles generosos. O que se sente sobretudo é um trabalho de equipa, em que todos querem fazer o seu melhor como Rita Ribeiro e Joel Branco, competentes, como sempre. Sissi Martins confirma-nos o seu talento quer a representar quer a cantar. Hugo Rendas mostra-se multifacetado, uma ou outra vez exagerando na piada mecanizada, provavelmente acusando o cansaço de um espectáculo estreado há muito no Porto e que só agora, felizmente Lisboa tem oportunidade de ver. Ruben Madureira canta muito bem, mas cantar não é tudo… E a equipa Raposo/Lá Feria resulta e muito bem. Espero que por muitas mais produções. Vão ver que não se vão arrepender.
João Antunes

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Vai de Em@il a pior

com: FLORBELA QUEIROZ, PAULO VASCO, CARLOS QUEIROZ, VANESSA, JOANA BAETA, CRISTINA AURÉLIO, DAVID VENTURA, RAQUEL LOURENÇO, JOÃO DUARTE COSTA, ÉLIA GONÇALVES, A COMPANHIA DE DANÇA "TMV", DE MARCO DE CAMILLIS, ORQUESTRA "CARMIM"
Direcção de Ensaios/Encenação: FRANCISCO NICHOLSON, Texto: FRANCISCO NICHOLSON e MÁRIO RAÍNHO, Música: JOSÉ CABELEIRA e PEDRO LIMA, Direcção e Criação de Montagem: MONIZ RIBEIRO, Cenografia: LUÍS FURTADO, Construção Cenográfica: JOSÉ MARTINS, Figurinos: MAGDA CARDOSO, Mestra do Guarda-Roupa: EMÍLIA DE MORAIS, Adereços de Cena e Guarda-Roupa: JOÃO QUINTÃO, Cabeleiras: CARLOS AFONSO, Ensaios Musicais/Orquestrações: CARLOS DIONÍSIO, Direcção/Criação Coreográfica: MARCO DE CAMILLIS

A revista é um tipo de teatro muito particular, uma coisa entre o profissional e o amador, entre a festa de bairro e o espectáculo com ambições de uma Broadway chamada Avenida da Liberdade.
Nesse sentido, Vai de Email a Pior faz jus a todos esses predicados. A mim choca-me sempre um bocadinho a vulgaridade, os exageros, as piadas fáceis e muitas vezes a roçarem o mau gosto… Mas se calhar é disto que o povo gosta. Por outro lado, sendo eu também elemento do povo, também me fascina essa simplicidade e esse despretenciosismo da revista e principalmente desta, que nesse sentido há umas piores que outras. E Nicholson e Mário Raínho estão de parabéns. O texto é sólido e segura bem os actores. São umas horas bem passadas, ah pois que são.
É espectacular ver Florbela Queiroz a regressar a um palco. Há coisas que não se esquecem, que são como andar de bicicleta e a Florbela sabe. Temos o Paulo Vasco, sempre a piscar o olho ao espectador (afinal, não é por causa dele que ali estamos?) e o espectador gosta. Temos a Vanessa que me parece que querem à força fazer dela uma nova Marina Mota e que nos arrepiou a todos naquela sala quando antes nos tinha deixado com um gosto amargo na boca por uma cena menos conseguida que melhoraria muito pela assunção do tom e do exagero dos seus colegas. Ainda destaco João Duarte Costa que mostra talento para o que faz e para o que há-de vir a fazer. Espero que a revista não o estrague com as suas tradiçõezinhas um bocadinho bacocas e que ele faça mais, muito mais, tal como todos eles. O que eu detesto no teatro são as quintinhas, uns que só trabalham com uns e outros que só trabalham com outros. Claro que está a mudar, mas ainda devia mudar mais. Deviamos ser todos multifacetados e não nos deixarmos rotular por este ou aquele tipo de teatro.
Só uma nota: eu sei que a revista tem compêndios de cenas que se introduzem e a ordem das mesmas. Agora: por amor da Santa… Tirem-me a Pandora… O que é aquilo? Não aquece nem arrefece, só chateia. E depois… Aquelas mensagenzinhas demagogas da paz-ita… Não há paciência. Aqueles piscar de olhos para referências da cultura popular parecem-me sempre homenagens de trazer por casa, de quem tem pouca imaginação e poucos recursos. Será mesmo que ninguém sabe que aquela música é a versão do Roxanne dos Police no filme Moulin Rouge? Não há mais nada que se crie para ser preciso ver um tango bem dançado? E eu só penso: Será que o James Cameron sabe? Será que o Baz Lurhman sabe? Será que a ministra da cultura sabe se eles sabem?
Curioso também foi ver a Ministra da Cultura lá. Deve ser a reforçar o seu interesse no Parque Mayer, para reafirmar que não está esquecido, blá blá blá… E de vez em quando olhava para os músicos, curiosa. Nunca se viu num fosso daqueles, pois não?
Revista é isto, é não deixar cair os finais, é tudo em boneco, tudo exagerado. Mas já se sabe ao que vai, qual é a surpresa? É tudo um bocadinho festa de final de curso ou festa de Natal lá do bairro onde o primo faz os vestidos, é tudo um bocadinho espírito de marchas, santos populares e sardinhas, que é tão característico de Lisboa. Goste-se ou não, Lisboa é isto.
João Antunes

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

A Aurora está feliz!

A Aurora está muito contente por hoje ter, finalmente, estreado no blog um texto enviado por um leitor. A Aurora gostaria de dizer que mais pessoas já enviaram textos, mas até agora, em vez de criticas ou comentários, eram quase todos para fazer publicidade a um espectáculo ou para promover um actor. Ela quer lembrar que o objectivo do blog é que se possa colocar, num espaço comum, as opiniões e comentários de todos em forma de texto crítico (e não precisa de ser muito elaborado, podes partilhar apenas as tuas sensações ao ver o espectáculo).
Assim, para quem quiser publicar algum texto crítico sobre um espectáculo de Teatro, já sabe, basta enviar para aurora.aurora@iol.pt

Crime e Salvação - primeiro texto enviado para o blog!!!!

Espectáculo: Crime e Salvação
Encenação e Interpretação de Sónia Barbosa
Este espectáculo, (ao que sei só esteve uma noite no Porto, não sei se vai ou esteve em mais cidades) é o resultado de uma adaptação de dois textos de Marguerite Duras interpretados por uma actriz em forma de monólogos.
A encenação servia as histórias, apesar de não ser brilhante (alguns momentos foram interessantes, mas a maioria eram apenas ilustrativos da narração). A actriz esteve bem, no entanto é necessário um trabalho na forma de dizer o texto pois as pausas, abusadamente usadas em momentos não certos (uma certa tendência para breves respirações no meio das frases em momentos que retiravam a carga dramática) davam a entender uma certa rigidez na forma como gestos e palavras supostamente deveriam casar.
Na minha opinião o espectáculo tem potencial para crescer se for apresentado mais vezes, pois sentia-se que alguns dos problemas seriam colmatados se a actriz tivesse oportunidade de rodar mais vezes o espectáculo.
Nota positiva para o número de pessoas que estava na sala a assistir. Sendo um espectáculo pontual (nem percebi se estava associado a alguma companhia, mas não me pareceu) estavam bastantes pessoas. Talvez que, afinal, a cidade do Porto esteja com vontade de cultura!
Rui Matos