(Labirinto em construção à maneira de Durrenmatt)
Direcção: Lígia Roque
Interpretação: Daniel Pinto, Daniela Vieitas, Joana carvalho, João Castro e Sara Carinhas.
(Quarta, dia 29 de Dezembro de 2010)
Miragaia, porta 61, uma entrada mais entre os arcos de pedra gasta.
Lá dentro, um espaço despojado, todo negritude, escassas fiadas de bancos defronte do "palco", aguardando o que se seguiria. E nós, público que sobre eles se distribuiu, irmanados nessa espera.
Tal ausência de "coisas", o cenário reduzido a parcos objectos, a escuridão palpável , propiciou o enquadramento perfeito para que o texto de Friedrich Dürrenmatt se fosse impondo, espelhando as suas subtilezas, oferecendo uma outra história dentro da história, oscilante entre a tragédia predestinada e uns apontamentos de humor sabiamente introduzidos.
A chegada dos momentos de luz, rompendo o negro, a crueza com que desvelavam e, simultaneamente, despojavam as faces das personagens e impulsionavam a dinâmica da peça, revelou-se uma solução engenhosa. E através das vozes e gestos dos que cruzaram e dominaram o palco, tornou-se possível recriar de forma clara todos os espaços que não vimos: o interior das grades e o desespero, que ainda assim se mostrou risível; a rua, caminho fora até ao edifício barroco; a escadaria penosamente subida, em direcção à mulher subitamente desejada e ao crime prometido...E assistir ao crescente imiscuir dos mundos, à "transfiguração" final, culminar de um trajecto que começou no desdém de quem, do lado de cá, se sentia tão seguro e afirmava cioso dos pormenores em falta da história lacunar, e terminou dentro dela, clamando pela inocência de um homem que, por imposição, acabou por, enfim, ganhar nome. Clamando contra O Outro (assim prefiro que continue a chamar-se), o criminoso manipulador. O epílogo a chegar quase que sob a forma de "vitória" de quem tudo teceu e urdiu.
Tudo, naquele Outro Ensaio, funcionou. Seria um prazer re-ver e re-ouvir as vozes deste eventual "sonho", tal como foi oferecido a quem penetrou naquela porta. Mais tivessem podido fazê-lo...
Andreia Magalhães